terça-feira, 2 de maio de 2017

RIFLE

Quando começou a tocar os primeiros acordes da melodia, rapidamente as lágrimas se formaram em seus olhos, e antes mesmo da canção chegar ao segundo verso, elas já rolavam pelo seu rosto.
Gostava daquela canção muito antes de conhecê-la. No entanto, foi ao lado dela que ganhou um sentido.
Não que significasse algo da história deles. Não era isso. Era mais aquele lance em que os astros se alinham e, pah!, de repente, a música abarca tudo. Do princípio até o fim.
E, agora, sem ela em sua vida, surgia outro significado.
Ouvindo e sofrendo com cada palavra daquela balada, ele também queria ser jovem e fugir da cidade; enterrar os sonhos sob o chão; beber até morrer.
Queria uma arma de caça para abater a maior das feras: a dor.
Se estivesse ali, ela responderia que a maior das feras era ele mesmo e a sua podridão. Ele gritaria – pois era o que sempre fazia – tentando convencê-la do contrário, porém, lá dentro dele, assentiria. Concordaria com tudo e se declararia o rei das feras.
E, assim, estava aberta a temporada de autocomiseração.
Sentiu-se no mais absoluto clichê: a música tocando, ele chorando, o copo de bebida na mão.
Chuva... Faltava chuva. Para ser um clichê total, precisava de um temporal caindo lá fora. Porém, aquela época do ano era sempre seca. Não iria chover. E deus algum iria atender esse capricho dele para alimentar ainda mais o seu espetáculo de vitimismo.
Queria chuva e como não tinha, chorou por isso. Chorou porque a bebida estava acabando. Chorou por causa da canção. E, por fim, chorou porque sentia saudade dela.
Um completo e medíocre clichê.
Conversou mentalmente com ela, tentou justificar o injustificável. Pediu desculpa. Mandou se foder. "Maldito elefante!", gritou. E cantou e bebeu e chorou.

Com a música chegando ao final, ele já se preparava para pressionar o repeat. Precisava chorar um pouco mais.